Outro detento, Nego Preto, espécie de "juiz" para desavenças internas, soluciona o caso em tempo de dar "boas vindas" ao Médico, recém- chegado e disposto a realizar trabalho de prevenção à AIDS na penitenciária.
O Médico depara-se, no maior presídio da América Latina, com problemas gravíssimos:
superlotação, instalações precárias, doenças como tuberculose, leptospirose, caquexia, além de pré-epidemia de Aids. Os encarcerados lamentam, além da falta de assistência médica, de assistência jurídica.
O Carandiru, com seus mais de sete mil detentos, constitui-se em grande desafio para o Doutor recém-chegado. Mas bastam alguns meses de convivência para que ele perceba algo que o transformará: mesmo vivendo situação-limite, os internos não são figuras demoníacas. No convívio com os presos que visitam seu improvisado consultório, o Médico testemunha solidariedade, organização e, acima de tudo, grande disposição de viver.
Oncologista famoso, habituado à mais sofisticada tecnologia médica, o Doutor terá que
praticar sua medicina à moda antiga, com estetoscópio, sensibilidade e muita conversa. O trabalho começa a apresentar resultados e o Médico ganha o respeito da coletividade.
Com o respeito, vêm os segredos. As consultas vão além das doenças, pois os detentos
começam a narrar histórias de vida. Os encontros na enfermaria transformam-se em "janelas" para o mundo do crime.
Flash backs reconstroem estas narrativas. Zico e Deusdete, amigos inseparáveis na infância e pré-adolescência, conhecem destino trágico na cadeia (um, alucinado pelo consumo de crack, matará o outro). O traficante Majestade desfila, com ginga, seu poder pelo
presídio, além de desfrutar do amor de suas duas mulheres, Dalva e Rosirene.
O velho Chico, homem sábio, cultivado na solitária, adora balões e está prestes a ganhar a liberdade e reencontrar os 18 filhos.
O "juiz" Nego Preto, líder da massa carcerária, tem tanto problema para resolver, que o Médico diagnostica seu mal: stress. O matador Peixeira, com 39 condenações nas costas, passará por ruidosa conversão, tornando-se pastor evangélico.
O surfista Ezequiel viverá, no cárcere, sua ascensão e queda. Os amigos Antonio Carlos e Claudiomiro, assaltantes de banco, se desentenderão por causa da ardilosa e perversa Dina.
O "filósofo" existencialista Sem Chance viverá romance de conto de fada com a divina Lady Di. O diretor do presídio, o Sr. Pires, pisa em ovos para administrar a cadeia.
A narrativa do filme arma-se como um quebra-cabeça.
Uma história encaixa-se na outra para formar painel realista da tragédia brasileira. Com o Médico, o espectador acompanha os movimentos cotidianos dos presos, até a eclosão -- em dois de outubro de 1992 -- do mais terrível abalo da história da Casa de Detenção de São Paulo (e do Brasil): o Massacre do Carandiru.